De Uma Vampira a Quem Possa Interessar
Ontem,
acordei com um pouco de dor de cabeça sem saber o que estava acontecendo. Ao
meu lado sentado no chão, estava ele, de olhar sombrio e um sorriso diferente
de todos que já havia visto em minha vida. Parecia um lobo faminto com as
presas sujas de sangue.
-
Você recebeu a graça do senhor da escuridão – dizia ele com uma voz desanimada
e um sorriso perverso. – Senhor esse que irá te ajudar nesta tua vida sofrida,
todas as dores da tua alma ele irá cicatrizar, e nada mais terá importância,
por que neste corpo teu não habita mais alma alguma.
Fiquei
confusa, e sentia dores por todo o corpo, mas havia um local que a dor parecia
interminável, era o meu pescoço, estava ardendo e queimava como brasa. Passei a
mão e percebi que a dor não era em vão, estava sangrando e senti que havia
furos naquela região.
–
Isso não é nada. – disse ele ao se levantar – Deverá sarar antes que digas teu
próprio nome.
E
foi o que aconteceu. Ele se levantou e com tamanha rapidez já estava com o
rosto encostado a minha pele, senti quando ele passou a língua em meu pescoço,
bem na ferida e em um segundo depois nada mais havia ali, nem feridas, nem
sangue. E com a mesma rapidez que se levantou ele se afastou e ficou parado
olhando para mim.
Ele começou a falar e suas palavras ecoavam em
minha cabeça. Explicou-me no que eu havia me transformado. Um ser da noite, um
vigilante do mal, uma criatura possuidora dos dotes maléficos.
O
dia havia acabado para mim, não poderei mas ver o brilho das manhãs, só a noite
poderia despertar para os meus olhos.
Quando
escureceu despertei do meu sono, um pouco cansada admito, e faminta. Estou
escrevendo essa carta para tentar desviar meus pensamentos, ainda estou
tentando acreditar no que sou, no que me transformei, mas não estou aceitando.
Eu
soube naquele momento que nada mas seria comum novamente, havia me tornado uma
vampira.
2
Mas aqui estou eu de volta. Desde a minha primeira carta
venho pensando muito em como farei para aceitar o que sou.
Sim, voltei a
escrever depois de alguns dias porque não entedia o que se passava em minha
vida, comecei a compreender a pouco tempo. Não pedi a imortalidade que tantos
desejam e sim, pedi para superar a dor que consumia o meu peito, mas os deuses
não me ouviram, e sim o Lúcios, que entendeu o meu suplico de forma estranha e
assustadora. Não desejo essa vida nem as piores almas. Mesmo por que isto não é
vida, a muito que a vida não existe neste corpo que levanta esta pena para
escrever mais uma carta desprovida de sentimentos.
Não sei ao certo quanto tempo se passou desde a minha
transformação, mas é como se tivesse passado toda uma vida, desde a infância
até a velhice, e depois retornando a ser criança para então envelhecer
novamente. Os dias passam e a eternidade me parece algo insuportável.
Passei muito tempo deitada, aceitando o que me era dado
para saciar a fome, uma fome sem fim. Lembro-me da primeira noite em que puder
sentir no que se baseava a minha fome. Ou seria sede?
Estava em minha cama, a mesma cama que dormia quando ainda
era viva, e o Lúcios veio me visitar, não poderia deixar de mencionar o quão
belo era aquele ser apesar de todo o medo que nutria em meio peito por aquela
criatura, que até aquela noite ainda era bastante desconhecida para mim. Ele me
transformou no que sou hoje.
O Lúcios
veio andando lentamente, como quem valsa, se aproximou de mim e perguntou – A
criança tem fome, sente vontade de beber algo? Sua voz parecia uma melodia da
qual eu poderia passar a noite ouvindo e ainda assim não me cansaria de me
inundar com aquele som maravilhoso. Mas havia algo na pergunta dele que
realmente chamou minha atenção, eu estava com fome, muita fome, mas não tinha
vontade de comer nada. Mas ele parecia ouvir tudo o que eu estava pensando e se aproximou
de mim, se ajoelhou no chão ao meu lado na cama e trazia em uma de suas mãos
uma taça de cristal, que brilhava e cintilava contrastando com o líquido escuro
que jazia dentro dela. Eu senti o cheiro e quase por impulso senti meu corpo se
erguer e mais rápido do que a minha mente pode acompanhar eu já estava aos pés
de Lúcios, olhando paralisada a taça e desejando sentir o gosto daquele líquido
que me parecia muito com vinho, mas, sabia desde o momento que coloquei meus
olhos nela que o cheiro era muito melhor que vinho, era uma aroma diferente de
tudo que já havia sentido em minha vida. Segurei a taça e Lúcios não fez
objeção aos meus movimentos, apenas sorriu e fez um sinal com a cabeça como
quem indica para continuar a fazer o que já havia começado, a esta altura
minhas mãos já envolviam aquela taça e minha boca sentia pela primeira vez o
gosto do sangue humano. Não fazia ideia de como era maravilhoso e saboroso
aquele líquido. E assim se seguiu, noite após noite, ele vindo me visitar, eu
permanecia deitada em minha cama, mas ele vinha, todas as noites e me
alimentava. Meu despertar passou a ter um propósito, me alimentar.
3
Ontem à noite o Lúcios veio
até a cama e me pediu para levantar e me arrumar pois íamos dar um passeio. Ele
estendeu a mão em minha direção, foi quase como se ele implorasse, mas ele nem
abriu a boca, eu já estava em pé, ao seu lado segurando sua mão e olhando em
seus olhos. E então ele falou – vista o que está sobre a cama. E depois de
terminar a frase ele soltou a minha mão e saiu do quarto, não tão rápido como
das outras vezes, pude ver que quando estava perto da porta do quarto ele
voltou à cabeça em minha direção e depois saiu.
Havia uma enorme caixa
branca sobre a minha cama, abri e lá estava um belíssimo vestido. Eu sabia que
era um vestido nobre. Era de um tom perolado com muitos bordados em fios
prateados quase imperceptíveis a primeira vista, mas que davam um ar de
diamante a todo aquele corpete. Um grande decote com fitas cruzando de um lado
para o outro nas costas. Tirei da caixa e o vesti, ele era perfeito para o meu
corpo. Fui até a sala. Em pé, ao lado das poltronas de chá estava o Lúcios,
sempre impecável, com sua cabeça erguida como quem espera ser atacado a
qualquer momento, sempre em alerta. Quando entrei senti uma brisa invadir meu
peito e passar pelos meus ombros nus. Os olhos de Lúcios vieram de encontro a
mim e percorreram aquela criatura que a muito não se levantava da cama, eu.
Não sabia se estava bem
vestida ou não, mas sabia que ao entrar naquela sala alguma coisa tinha mudado.
Então Lúcios veio até mim, segurou minha mão direita e a ergueu até seu lábio e
a beijou. Que lábios macios e carnudos,
tive a sensação de sentir a sua boa se abrir de encontro a minha mão como quem
se prepara para dar uma mordida, mas acho que foi apenas impressão. Eu podia
sentir leves ondas de emoções, eu sabia que podia sentir o que os outros
estavam sentindo, isso começava a explicar a estranha sensação de vento que
estava sentindo sempre que Lúcios se aproximava de mim e me tocava, por mais
leve que fosse esta aproximação física.
Em meio aos meus pensamentos
Lúcios me interrompeu e me chamou
- Vamos criança. Sim, era
assim que Lúcios sempre me chamava, desde a primeira noite.
O silencio se fez presente
em boa parte do passeio. De repente a carruagem parou, estávamos em frente ao
castelo de Melícias, uma estrutura magnífica com três enormes torres e uma
ponte sobre um rio que circundava toda a construção.
O castelo parecia uma ilha
rodeada de todo aquele rio escuro e belo, cheios de árvores ao fundo e muitas
esculturas espalhadas por todo o jardim da frente. A entrada estava repleta de
castiçais que formavam um corredor até a ponte e sobre ela formando um caminho,
nos guiando até o portão principal de entrada. Tudo estava perfeitamente
harmonizado, exceto eu, pobre imortal, que não fazia a mínima ideia do que me
aguardava lá dentro.
Gostei *****
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